sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Mea Culpa

Escrevi este texto ano passado logo depois do terremoto que devastou o Haiti. Não gosto de culpar o governo por tudo. o que importa é que o tempo passou e eu não fiz nada para ajudar. 


Cantiga para o Haiti

Acordo cedo. Os passarinhos fazem uma festa lá fora, indiferentes ao queacontece. Abro a porta da varanda. Respiro fundo. O verde entra pelas minhas narinas, me convida. As azáleas em diferentes tons de rosa combinam com as hortênsias e emolduram o caminho que vem até minha casa. As borboletas ainda não apareceram. Talvez um pouco mais tarde. As helicônias estão tão lindas, em laranja néon que, se, bem descritas vão romper a tênue linha que separa a verdade do exagero..
Respiro fundo. Alguém me chama para o café. Mesa farta. Escolho um suco e corto em rodelas uma banana que vou comer com algum cereal. Olho através do vidro, uma felicidade imensa me invade. Desde muito pequena a sensação de felicidade vem acompanhada de uma melancolia profunda.
Aluna de colégio de freiras tinha missa obrigatória às quartas-feiras. Sempre gostei de ir a missa. Gostava de tudo: Da pequena capela do Colégio, toda iluminada por enormes janelas de vidro, verdadeiras vitrinas para a mata-atlântica que cercava o pequeno prédio. Gostava da singela decoração com flores naturais que ladeavam imensos castiçais. Gostava da roupa do padre, do sermão, gostava sobretudo das cantigas. E a melancolia?
“Para mim a chuva no telhado é cantiga de ninar, mas o pobre meu irmão para ele a chuva fina vai correndo em seu barraco e se esparrama pelo chão”.
Não era raro cantarmos esta canção na missa. Com doze anos eu não sabia o que era melancolia. Mas sempre que ouvia esta cantiga duas lágrimas me escorriam pelo rosto. Um aperto no coração.
Olho a natureza, generosa, com seus verdes o colorido das flores o canto dos passarinhos e lá vem a melancolia cantada. E o pobre meu irmão?
O Haiti foi destruído. Obra da mesma natureza que me presenteia a cada manhã com pássaros, flores s e borboletas e que me faz suspirar.
Nestas horas é fácil encontrar culpados. A Natureza, o Sistema, os Países Ricos etc e tal, infinito e além. A tragédia não tem cara. É descarada. Por um instante penso em parar de escrever este texto. Assunto veiculado à exaustão pelamedia. Que também não tem cara.
Mas o pobre meu irmão? O que fazer?
Os brasileiros se ofendem quando os americanos não sabem nem localizar o Brasil no mapa. Acham até infame quando um americano pergunta se tem jacaré atravessando as ruas. Mas a verdade é que não sabemos nada nem de nós mesmos.
Eu não sabia que o Haiti era o país mais pobre das Américas, nem que lá poderia ter terremoto e que este poderia ter esta proporção. Infinitamente triste. Eu sou ignorante. A verdade é esta. Ignoro tanta coisa que me pergunto se estou viva.
Não sei o que fazer para ajudar o pobre meu irmão e isso me angustia muito. Penso em largar tudo e ir para o Haiti e dar carinho e conforto. Penso também que não preciso ir tão longe, que o pobre meu irmão está bem aqui ao meu lado. Que me faz uma média pela manhã e me entrega com um sorriso no rosto. Que enquanto lixa minhas unhas me conta como sua casa ficou alagada e da sorte que teve considerando que nada aconteceu aos seus filhos.
Não consigo concluir, porque não consigo entender. O que fazer? Rápido. Antes que outra tragédia aconteça.


Um comentário:

Léo Manza disse...

pior do que não ajudar as pessoas é a pessoa que necessida não querer sua ajuda ! experiencia propria.